Desigualdade, imposto e jornada: o Brasil em busca de justiça social
- Pedro Emerenciano

- 6 de jun.
- 3 min de leitura

Em 2024, o Brasil registrou uma queda significativa na desigualdade social, impulsionada por dois fatores centrais: o crescimento de 10,7% na renda do trabalho da população mais pobre e a retomada de políticas públicas voltadas à valorização do salário mínimo. Tais avanços resultaram de decisões políticas e econômicas que contribuíram para a geração de empregos formais e para o fortalecimento das políticas de transferência de renda.
A política de valorização do salário mínimo, descontinuada em 2019 e retomada em 2023, impacta diretamente 59,9 milhões de brasileiros, entre assalariados, servidores públicos, aposentados, pensionistas e beneficiários de programas sociais. Apesar do avanço, a distância entre os extremos da renda nacional permanece alarmante: o rendimento médio do 1% mais rico foi 40 vezes maior que o dos 40% mais pobres em 2023, segundo dados do Dieese.
Esse abismo compromete o desenvolvimento sustentável do país. Grande parte da população ainda se encontra à margem do consumo, sem acesso a empregos dignos. A limitação da renda e da inclusão produtiva restringe o investimento e a inovação, fatores decisivos para o crescimento econômico e tecnológico.
Rumo a um sistema tributário mais equitativo

Em março de 2025, o governo federal apresentou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 1.087/2025, que propõe isenção de Imposto de Renda para contribuintes com rendimento mensal de até R$ 5 mil. A medida, prevista para entrar em vigor em 2026, alcançaria cerca de 10 milhões de pessoas. Paralelamente, o projeto prevê aumento na carga tributária de quem ganha acima de R$ 50 mil por mês, faixa que concentra apenas 0,13% dos contribuintes.
A proposta representa um passo importante para tornar o sistema tributário mais progressivo. Hoje, o modelo brasileiro contribui para aprofundar a desigualdade. Estudo do Dieese aponta que os 10% mais pobres arcam com uma carga tributária 6 pontos percentuais superior à dos 10% mais ricos. Apenas 27% da arrecadação vem de impostos sobre a renda, enquanto os tributos indiretos, mais regressivos, respondem por 40% da carga total.
Além disso, a defasagem da tabela do Imposto de Renda — congelada entre 2016 e 2022 — tem provocado aumento contínuo da tributação sobre os rendimentos médios. Atualmente, rendimentos superiores a R$ 4.664,68 estão sujeitos à alíquota máxima de 27,5%, a mesma aplicada sobre rendas significativamente mais altas.
A luta por um tempo de trabalho mais justo
A redução da jornada de trabalho permanece no centro das pautas sindicais. A reivindicação, que originou o Dia Internacional do Trabalhador em 1886, quando operários de Chicago exigiram o limite de 8 horas diárias, mantém atualidade no cenário brasileiro.

Hoje, a jornada habitual média dos assalariados no Brasil é de 41 horas e 30 minutos semanais. Quase metade deles ultrapassa esse limite. O debate atual gira em torno não apenas da redução da carga horária, mas da reorganização do tempo de trabalho ao longo da semana, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida e o equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
Segundo o Dieese, a redução da jornada e o aumento da progressividade tributária — aliados à ampliação da faixa de isenção do IR e à taxação sobre grandes fortunas e dividendos — podem formar um ciclo virtuoso. Essas medidas redistribuem renda, ampliam o poder de compra das classes trabalhadoras e impulsionam a economia real.
Reivindicações estruturantes
A proposta em debate se alinha à plataforma apresentada pelas centrais sindicais ao presidente Lula ainda em 2022. Entre os principais pontos estão o reajuste anual da tabela do IR pela inflação, a criação de mais faixas de tributação para aumentar a progressividade, e a revisão das isenções sobre lucros e dividendos — que hoje favorecem as altas rendas.
A ideia central é clara: tornar o sistema mais justo, onde os que ganham mais contribuam proporcionalmente mais. Segundo o Dieese, isso reforça o pacto social necessário à construção de um país menos desigual e com oportunidades reais de mobilidade social.
Desenvolvimento sustentável exige equidade
A retomada do crescimento com inclusão depende da consolidação de políticas distributivas. Para o Dieese, o fortalecimento do papel dos trabalhadores, a valorização do salário mínimo, a tributação justa e a jornada equilibrada compõem o alicerce de um modelo de desenvolvimento sustentável, que prioriza justiça social e expansão econômica.
O debate atual revela uma sociedade em busca de equilíbrio: entre tributar e redistribuir, entre trabalhar e viver. Para que o Brasil avance, essas escolhas precisarão sair do campo do discurso e ganhar espaço efetivo na agenda política.



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